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janeiro 30, 2021

TARDES VAZIAS

 
TARDES VAZIAS

Com o coração dorido
Ainda a taça é uma ternura
Errante em minha mesa
Seu frescor borbulha
É oferta que delira
Embebedar de rosas
Sem romper prismas
Quentes de minha alma.
Em meio às camadas
De terra e de flores
Que ainda sobram
Na memória o cheiro
Das tardes vazias
Sem fantasias murchas
Que jogam no tempo do jamais
Que a alma vislumbra.

O arco-íris do voo dos pássaros
Nesta realidade abre-se
Hoje em paralelas esquecidas
Nos afluentes (re) virados
Humana  lida infértil
Que ainda vê brilhar
Safiras que lançam
Claridades que se impõem

 Iara Pacini

A dor e a saudade...



 "A dor e a saudade
são dois pássaros em voo
tentando alcançar o galho mais alto
do esquecimento..."

£una 

janeiro 28, 2021

CHEIRO DE OUTONO



CHEIRO DE OUTONO 

 Mais uma vez é um verão que nos abandona, 
agonizando num temporal atrasado: 
tranquila a chuva rumoreja, enquanto um cheiro 
amargo e tímido vem do bosque molhado. 

 Na relva pálida a liliácea se retesa 
em meio a grande profusão de cogumelos; 
tem-se a impressão de que se esconde e se retrai o
 nosso vale, ontem ainda imenso e belo. 

 Retrai-se e cheira a timidez e a amargura 
o mundo, com toda a claridade perdida: 
prontos, olhamos o temporal atrasado, 
pois acabou-se o sonho de verão da vida! 

 Hermann Hesse 
In Andares

A CHUVA

 


A CHUVA

Bruscamente a tarde se clariou
Porque já cai a chuva minuciosa.
Cai ou caiu. A chuva é uma coisa
Que sem dúvidas acontece no passado.

Quem escuta cair há recobrado
O tempo em que a sorte venturosa
Lhe revelou uma flor chamada rosa
E a curiosa cor do vermelho.

Esta chuva que cega os cristais
Alegrará em perdidos arredores
As negras uvas de uma videira certamente

Pátio que já não existe. A molhada
Tarde me trai a voz, a voz desejada,
De meu pai que retorna e que não morreu.

Jorge Luis Borges

AMO VOCÊ

 

AMO VOCÊ

O dia amanheceu chuvoso.
A natureza chora.
Chora também meu coração.
A saudade
que sua ausência me trás,
Aperta-me o peito.
Sufoca em mim a voz
Que teima em querer
Gritar alto e para todos,
o quanto amo você.
Mas o grito fica retido
No vazio da solidão
Em que me encontro.
Resta-me apenas o consolo
De poder molhar meu rosto
Nas águas da chuva
E misturar minhas lágrimas
Às lágrimas da natureza
Deixando-as, juntas, caírem
Fertilizando o solo que nos sustenta.

Marisa Nieri®

janeiro 26, 2021

CANÇÃO DE UM CREPÚSCULO CARICIOSO



CANÇÃO DE UM CREPÚSCULO CARICIOSO

 A tarde expira, serena... 
Adormece em minha mão 
a pena suave, a pena 
com que, na tarde serena,
 vou compondo esta canção. 

 Um casinholo da vila,
 na sombra do entardecer, 
iluminado cintila. 
O movimento da vila 
começa agora a morrer. 

 Vem de longe, dos carreiros,
 a mágoa sentimental 
da canção dos boiadeiros. 
Que doçura nos carreiros, 
ocultos no matagal! 

 Num recôncavo da praia, 
soturno soluça o mar. 
Soluça... A tarde desmaia... 
E o mar no lenço da praia 
limpa os olhos, a chorar... 

 Muito à distância, navios 
que o crepúsculo esfumou,
 vão partindo, fugidios...
 A voz triste dos navios 
diz adeus a quem ficou...

 E a tarde expira, serena... 
Adormece em minha mão 
a pena suave, a pena 
com que, a tarde serena, 
vou compondo esta canção...
 
Ribeiro Couto

NO JARDIM NA PENUMBRA



 NO JARDIM EM PENUMBRA

Na penumbra em que jaz o jardim silencioso
A tarde triste vai morrendo... desfalece...
Sobre a pedra de um banco um vulto doloroso
Vem sentar-se, isolado, e como que se esquece.

Deve ser um secreto, um delicado gozo
Permanecer assim, na hora em que a noite desce,
Anônimo, na paz do jardim silencioso,
Numa imobilidade extática de prece.

Em lugar tão propício à doçura das almas
Ele vem meditar muitas vezes, sozinho,
No mesmo banco, sob a carícia das palmas.

E uma só vez o vi chorar, um choro brando...
Fiquei a ouvir... Caíra a noite, de mansinho...
Uma voz de menina ao longe ia cantando.

Ribeiro Couto

SONETO DA FIEL INFÂNCIA

 


SONETO DA FIEL INFÂNCIA 

Tudo que em mim foi natural — pobreza,
 Mágoas de infância só, casa vazia, 
Lutos, e pouco pão na pouca mesa —
 Dói na saudade mais que então doía. 

 Da lamparina do meu quarto, acesa 
No pequeno oratório noite e dia, 
Vinha-me a sensação de uma riqueza 
Que no meu sangue de menino ardia. 

 Altas horas, rezando no seu canto, 
Minha mãe muitas vezes soluçava 
E dava-me a beijar não sei que santo. 

 Meu Deus! Mais do que o santo que eu beijava, 
Faz-me falta o cair daquele pranto 
Com que ela junto ao peito me molhava. 

 Ribeiro Couto

ESQUECER

ESQUECER

Longos dias de sonho e de repouso...
Ócio e doçura... Sinto, nestes dias,
Meu corpo amolecer, voluptuoso,
Num desfalecimento de energias.

A ler o meu poeta doloroso
E a fumar, passo as horas fugidias.
Entre um cigarro e um verso vaporoso
Sou todo evocações e nostalgias.

Quando por tudo a claridade morre
E sobre as folhas do jardim doente
A tinta branca do luar escorre,

A minha alma, a mercê de velhas mágoas,
É um pássaro ferido mortalmente
Que vai sendo arrastado pelas águas.
 
Ribeiro Couto 

CHUVA


CHUVA

A chuva fina molha a paisagem lá fora.
O dia está cinzento e longo... Um longo dia!
Tem-se a vaga impressão de que o dia demora...
E a chuva fina continua, fina e fria,
Continua a cair pela tarde, lá fora.

Da saleta fechada em que estamos os dois,
Vê-se, pela vidraça, a paisagem cinzenta:
A chuva fina continua, fina e lenta...
E nós dois em silêncio, um silêncio que aumenta
Se um de nós vai falar e recua depois.

Dentro de nós existe uma tarde mais fria...

Ah! para que falar? Como é suave, brando,
O tormento de adivinhar — quem o faria? —
As palavras que estão dentro de nós chorando...

Somos como os rosais que, sob a chuva fria,
Estão lá fora no jardim se desfolhando.

Chove dentro de nós... Chove melancolia...

Ribeiro Couto
In O Jardim das Confidências.

CANÇÃO DE UM CREPÚSCULO CARICIOSO



CANÇÃO DE UM CREPÚSCULO CARICIOSO

A tarde expira, serena...
Adormece em minha mão
a pena suave, a pena
com que, na tarde serena,
vou compondo esta canção.

Um casinholo da vila,
na sombra do entardecer,
iluminado cintila.
O movimento da vila
começa agora a morrer.

Vem de longe, dos carreiros,
a mágoa sentimental
da canção dos boiadeiros.
Que doçura nos carreiros,
ocultos no matagal!

Ribeiro Couto

A ALEGRIA DA TERRA SOB O AGUACEIRO

 

A ALEGRIA DA TERRA SOB O AGUACEIRO

Do céu cinzento a chuva em fios longos coa ...
Molha-se o parque. Vê, que alegria na terra!
Toada a paisagem bebe a água da chuva boa
E uma bruma sutil entre as árvores erra.
Bom tempo! Quando chove é que é bom tempo ...
Sinto
Que no meu coração, qualquer coisa desperta.
Qualquer coisa ... Talvez um sofrimento extinto.
Talvez mesmo outra vida, uma outra vida incerta ...
Escutando o bater da chuva nos telhados
Tenho um desejo triste, um desejo doente
De viver só, viver entre livros amados,
Numa cidade que imagino vagamente ...
Olho, desencantado, as águas da baía:
No mar, que a chuva torna um pouco mais distante,
Vem fugindo uma vela em demanda no cais.
E de um pontinho muito apagado, lá adiante,
Uma fumaça diz adeus ... “ Não volto mais!...”
Olho de novo o parque. Entre as árvores erra
A bruma leve que as envolve e acaricia ...
A bruma tem a volúpia longa e fria ...
Como que a bruma é o gesto amoroso da terra,
Um gesto mole de desejo e nostalgia,
Para a folhagem sob o aguaceiro macia...

Ribeiro Couto
Melhores Poemas

CAI A CHUVA ABANDONADA


CAI A CHUVA ABANDONADA

Cai a chuva abandonada
à minha melancolia,
a melancolia do nada
que é tudo o que em nós se cria.

Memória estranha de outrora
não a sei e está presente.
Em mim por si se demora
e nada em mim a consente

do que me fala à razão.
Mas a razão é limite
do que tem ocasião

de negar o que me fite
de onde é a minha mansão
que é mansão no sem-limite.
Ao longe e ao alto é que estou
e só daí é que sou.

Vergílio Ferreira,
in 'Conta-Corrente 1'


BUSCA


 
Busca
(reginahelena)

Em meio ao som da chuva
ouço o meu coração
batendo na cadência dos meus passos,
arrastando a água...

tudo é inútil, eu sei
e vejo agonizar em mim a esperança.
...e então, mergulho de vez na embriaguez
da mística loucura da saudade.

AO SONO

 


AO SONO 

 Rebanho de ovelhas que lentamente passa 
Uma de cada vez, o som da chuva e o farfalhar 
Das folhas ao vento, abelhas, cascatas e o mar, 
Prados, lenços d’água e o céu que esvoaça; 

Sobre eles divaguei, um por um e ainda estou 
Desperto! Logo os pássaros cantando 
Nas árvores do pomar estarei escutando, 
E o primeiro trinado do cuco que lá pousou. 

 Ontem e nas duas outras noites foi assim Sono! 
Com todos os ardis não te pude receber: 
Poupes-me nesta noite, vem a mim 

 Sem ti, que seria do encanto do alvorecer? 
Vem, barreira entre o dia e a noite, enfim, 
Pai do fresco pensar e do saudável viver!

 William Wordsworth 
in O olho Imóvel pela Força da Harmonia


Obrigada pela visita.
Volte sempre.

EU OUÇO MÚSICA

 



EU OUÇO MÚSICA 

 Eu ouço música como quem apanha chuva: 
resignado 
e triste 
de saber que existe um mundo 
do Outro Mundo... 

 Eu ouço música como quem está morto 
e sente já 
um profundo desconforto 
de me verem ainda neste mundo de cá... 

 Perdoai,
 maestros,
 meu estranho ar! 

 Eu ouço música como um anjo doente 
que não pode voar. 

 Mario Quintana, 
in Apontamentos de Historia Sobrenatural


Agradeço sua visita. 
Volte sempre e comente!

SEM TI E CONTIGO

 

Sem ti e Contigo 
(regina helena, sem verbo) 

 nas brumas do escuro mar
 ou nas areias frias de um deserto
 num breve segundo, a eternidade
 nas tristes sombras da saudade
 ...impensada dor da minha treva 

depois de tão longa caminhada 
de solitária dor, alma sofrida 
pelos caminhos rudes desta lida 
contigo, em meus braços, minha vida,
...impensada luz da minha treva

À MINHA TERRA


 

À Minha Terra
 (Regina Helena) 

Cidade dos meus encantos, terra minha! 
plantei saudades no solo da tua lembrança 
e só colhi desesperança!

 Semeei estrelas no escuro da minha dor 
mas no céu que te emoldura 
só vi a solidão de tão longa despedida... 

 Quantas saudades, cidade amada minha!
 Dos teus lindos campos... 
Da tua praça, da bandinha, da calçada da igreja, o som do sino...

 Ah, cidade amada! Pequenina dos meus sonhos... 
Tudo em ti rimava com felicidade... Mas hoje,
 Nenhum verso combina com tanta saudade...

O CORTEJO

 


O Cortejo
(regina helena)

e então, seguíamos na longa caminhada
pasmos, lívidos ante a dor medonha...
e em nosso rastro, a solidão da noite
a nos contemplar, sombria e muda!

parecíamos zumbis, calados, tristes...
entre um suspiro e outro,
a dor se revelando... e a noite,
parecia só nossa, calma, cúmplice...

mas, numa curva qualquer desse caminho,
pessoas em festa! um cão latindo,
crianças brincando! casais sorrindo!
gritos de alegria. Dança!

Eles não veem a nossa dor passar?
não sabem que o céu desabou sobre nós
e a terra se abriu e nos deixou sem chão?
Como podem viver, se a morte passa?!!!

e então, em meio à dor, o entendimento!
o inexorável, o inevitável fim,
vem para todos! mas naquele dia,
era a nossa vez, e a dor, só nossa!

POR AÍ ALÉM

 


POR AÍ ALÉM 
(Carlos Drummond de Andrade)

 Deixa um momento o asfalto, 
vem comigo, entre jogos de sombra e claridade 
conhecer a cintura da cidade. 

 Respira a plenitude do silêncio 
destes montes e montes sucessivos 
que ignoram a dor dos seres vivos.

 Mergulha no mistério vegetal 
da mata exuberante, onde as lianas 
e as bromélias se calam, soberanas.

 E na imobilidade do saveiro
 diante da igrejinha, vai sentindo 
o que é doçura e paz na hora fluindo.

HAICAI



Estou sempre em viagem. 
O mundo é a paisagem 
que me atinge de passagem

 Helena Kolody 
in "Viagem Submersa

OUTONO




Outono
(Miguel Torga)

Tarde pintada
Por não sei que pintor.
Nunca vi tanta cor
Tão colorida!
Se é de morte ou de vida,
Não é comigo.
Eu, simplesmente, digo
Que há fantasia
Neste dia,
Que o mundo me parece
Vestido por ciganas adivinhas,
E que gosto de o ver, e me apetece
Ter folhas, como as vinhas.

POBRES ROSAS DE CINTRA

Pobres Rosas de Sintra

Toma essas rosas de Dezembro, agora,
 Que ao frio, à chuva, esta manhã colhi, 
Elas trazem humildes, lá de fora, 
Saudades da montanha até aqui. 

 Hão de morrer d’aqui a pouco, embora! 
Em cada curva onde o perfume ri, 
Trazem mais o terno duma hora, 
Que um frágil coração bateu em ti. 

 Aceita-as pois, mas, como a vida é breve 
E, um dia, perto, leve e branca a neve, 
Há-de cair sobre o teu peito em flor, 

 (Não vá Dezembro algum murchar-te o encanto) 
Deixa tu que eu te colha agora, enquanto 
Tens sol, tens mocidade e tens amor. 

 Nunes Claro 
 De "Cinza das Horas"

ETERNA CHUVA



ETERNA CHUVA

Chove lá fora e a chuva apaga a poeira
Da minha estrada que não tem mais fim!
Seria bom que pela vida inteira
Essa chuva caísse sobre mim!

Sinto que a minha estrada sem palmeira,
Deserta, vasta e prolongada assim,
Impulsiona a minha alma sem canseira,
Para o mundo esquisito do senfim!

E eu marcho resoluto para a frente!
Cai-me a chuva nos ombros, de repente
Eu mais apresso a minha caminhada!

E assim prossigo nesse sonho eterno,
Sob a sentença de um constante inverno,
Sem promessas de sol na minha estrada!

Jansen Filho
In: Obras Completas

janeiro 25, 2021

TARDE TRISTE

 


Tarde Triste

Chove. A tarde triste está nublada...
E melancólica a chuva cai de leve...
Sutil, silenciosa e embaçada
Como se fosse um grande véu de neve.

Há silêncio no ar. Pela calçada
Desliza o pranto que a esta chuva deve.
Molha as plantas. E a rosa desbotada
Sente fugir a sua vida em breve.

O tempo transformou-se. Escurecendo
Fugiu o sol. E nuvens pesarosas
Derramam lentamente um frio pranto.

O silêncio as lembranças envolvendo
Traz saudade em recordações chorosas
Num cenário de encanto e desencanto.

Pinheiros, São Paulo - 26.12-1989


Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)

FUNERAIS


Funerais

Silenciosa a tarde se estremece
Nos estertores de uma dor imensa!
Só murmúrios no ar. Quanto padece
Na agonia mortal, cruel, intensa.

Nem um raio de sol à terra desce!
E os sinos evocam a voz da crença;
Nuvens ajoelhadas fazem prece
Na mais sutil e doce indiferença.

As flores tristemente estão chorando!
E pelo espaço infindo e desolado
Enorme véu de sombras vem descendo.

E do regato as águas vão rolando
Num gemido de dor, angustiado
Tudo porque o dia está morrendo.

Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)

COMO A PRIMAVERA

 


Como a Primavera

Se nasce a flor nos prados verdejantes
Ornamentando as orlas do caminho,
Voltam as andorinhas voejantes
Procurando os beirais do antigo ninho.

Adejam em semicírculos, doidejantes
Buscando o aconchego de um carinho ...
E com as asas ruflando, estonteantes
Chegam se agasalhando de mansinho.

A quem já não mais crê volta a esperança!
Vem a ilusão e os sonhos, a quimera...
Que vão e voltam no passar dos anos...

E como não me foges da lembrança
Quero que voltes como a primavera
Pra florescer meus tristes desenganos.

Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)

MEUS FILHOS

 


Meus Filhos

Pedaços do meu ser que tanto prezo
Por quem vivo, a quem amo, por quem choro
Rosário de minh'alma aonde eu rezo
Uma prece de amor por quem adoro.

Retalhos de minh'alma entristecida
Que é feliz porque sofre e porque ama
Que ao seu lado se sente enaltecida
E enaltece o amor que lhes proclama

São iguais. Todos vivem no meu peito.
Todos brilham no pranto dos meus olhos
E ao meu amor lhes dou igual direito.

Se juntos, lhes dedico igual deidade
Através da distância nos abrolhos
Meus suspiros lhes são de igual saudade.

Dandinha Vilar
De "Meus Versos" 1986


PRECE


Prece

De Deus eu quero a luz que me ilumine,
Do ser humano um pouco de bondade;
Do mal quer fiz, perdão que me redime
E da ilusão a grata realidade.

Do coração eu quero o amor que imprime
N’alma o fulgor da justa caridade;
Do sofrimento a lágrima que exprime
O bálsamo da dor, da acerbidade.

Da inocência a pureza que irradia,
Do pássaro cantor, da voz o encanto
E das campinas o olor inigualável.

Dos felizes, um pouco de alegria...
Dos que sofrem o alívio de seu pranto;
Da humildade e da paz o gosto afável.

Bernardina Vilar
In ‘Bom dia, Saudade!’ (1995)

MEUS CANTOS


Meus Cantos

Aos pés de Deus, humilde, por momentos
Fiz um canto de mística oração.
Juntando a voz das águas e dos ventos
Fiz desse coro um hino, uma canção.

Divulgando com ardor meus pensamentos
Cantei das aves doce entonação;
Do mar ouvindo lúgubres lamentos
Cantei das ondas a acre solidão.

E cantei mais: o hálito das flores...
Da noite escura tétricos negrores
E a transparente alvura do luar.

Mas quando quis cantar meus desencantos
Ao em vez de cantar eu chorei tanto
Que mais nada jamais pude cantar.

Dandinha Vilar
De "Meus Versos" 1986

AMIGO

 


Amigo

Amigo é aquele alguém com quem contamos,
De nossa vida, em todos os momentos;
Que o nosso pranto enxuga se choramos
Partilhando de nossos sofrimentos.

Amigo é a paz tranquila que encontramos
Em meio ao temporal dos desalentos;
É o apoio seguro que acatamos
Para suavizar nossos tormentos.

É a forte mão que para nós se estende,
É o clarão da luz que em nós se acende
Guiando, do amanhã, ao mar profundo.

Força que nos ajuda na subida,
Que faz parte de nós, de nossa vida,
E não trocamos por nada deste mundo.

Dandinha Vilar
De: Meus Versos - 1986

O CISNE


O Cisne

Ele veio de longe, o voo alçando
Sobre as matas em flor, sobre as campinas
Nas suas brancas asas carregando
Das ninfas o mistério das ondinas.

E através do espaço a voz soltando
Como entoando música divina
A saudade dos seus chegou cantando
Na voz traindo a dor que lhe alucina.

E no espelho das águas, majestoso,
Mirando-se imponente e vaidoso
Desliza em semi-círculos a nadar.

Como quem de uma dor vem se escondendo,
Vai pensando, a si mesmo prometendo
As lembranças nas águas afogar.

Dandinha Vilar
De "Meus Versos" 1986

SAUDADE

 


Saudade

Desde o princípio em que foi feito o mundo 
Uma sentença existe, e que não muda: 
Persiste o arraigado mais profundo 
Que o amor é cego e que a saudade é muda. 

 Passam-se os tempos e evolui a vida. 
Há inovações e toda lei se estuda; 
Ninguém remove a instigação antiga 
Que o amor é cego e que a saudade é muda. ...

Talvez se ame a quem não deva amarmos... 
E neste item com rigor me apego, 
Vendo a razão por que o amor é cego. 

 E se sofrermos por silenciarmos 
Do abandono a dor sobeja e aguda, 
Eis a razão por que a saudade é muda. 

 Bernardina Vilar 
de 'Meus Versos' 

SAUDADE

Saudade

Saudade é o longo espaço do momento
Em que murcharam nossas esperanças
É o sonho que restou no pensamento
Como uma apoteose de nuanças.

Saudade é conservar bem vivo, atento
O amor passado, cálida lembrança!
É contemplar sozinho ao desalento
A extrema solidão que em nós descansa.

Saudade é um coração pulsante forte,
Palpitante, ansioso, inconsolável
Por ver o aproximar de uma partida.

E ser logo atingido pela morte
De seu amor tão grande, inigualável,
Consumindo num adeus de despedida.

Bernardina Vilar
de Bom dia, Saudade

SAUDADE

SAUDADE
 
Saudade é a imagem das recordações...
De luz acesa, crepitante chama
Que aquece a alma e gera evocações
E sem querer o desengano engana.

Saudade é um verso feito de emoções...
Acre perfume que a doçura emana
Torpor que entrando em nossos corações
Quanto mais embriaga, mais inflama...

Doce abandono... Ausência merencória...
De um passado distante a viva história
Que em nós conserva uma lembrança pura.

Saudade é o silvo agudo de um lamento
Que escutamos no perpassar do tempo
Como sendo delícia e amargura.


Bernardina Vilar

SAUDADE

 

Saudade

Saudade é a imagem pura, viva, acesa
Fixada no olhar enevoado
Pelo pranto que corre com leveza
Sobre um rosto tristonho, amargurado.

Saudade é o riso pálido... É a tristeza
Que agita o peito, o coração magoado...
A despedida... O adeus e a incerteza
De ver em breve aquele ente amado.

Ver na rua a neblina, deslizando
Na bicicleta um vulto desfilando
Lembrando o neto que está distante.

E sentir logo os olhos rasos d’água,
Sentir no peito uma profunda mágoa
Nesta lembrança perenal, constante.

Bernardina Vilar

SAUDADE


Saudade

Saudade é aquela história do passado
Que o amor criou e o tempo destruiu
Mas que ficou no coração gravado
E da recordação nunca fugiu.

É a tristeza, o sonho desmoronado...
Palpitação que em nós se contraiu.
É um vulto, no olhar nunca apagado,
É um golpe que de chofre nos feriu.

É ver morrer um filho tão amado
Vê-lo partir como se um anjo fosse
Com usas de ouro para Deus subindo.

Deixando-nos perplexo, extenuado
Pelo torpor de um sonho que acabou-se
A nossa vida aos poucos destruindo.

Bernardina Vilar

MAIOR SAUDADE

Maior Saudade

Que noite linda! Sim, mas que tristeza
Abrange o ar e acoberta a serra!
O céu imerso em sideral beleza
Chora um pranto de estrelas sobre a terra.

Paira o silêncio em toda a natureza!...
A cortina das sombras se descerra
E a lua brota como vela acesa
Tudo envolvendo no palor que encerra.

Que paz tranqüila! Que serena calma!
E eu pasma em frente à dor que me apavora
Não te encontro e me cresce a ansiedade...

Do pranto o encanto me anuvia a alma
E nesta angústia que me punge agora
Sinto que és tu minha maior saudade.

Bernardina Vilar

Uma saudade a mais

Uma saudade a mais

Saudade a gente sente a qualquer hora:
Do bem maior que se nos vai deixando.
Saudade de um amor que foi embora,
De alguém que parte a nos deixar chorando.

Das venturas que não se tem agora;
Da flor pendida o prado perfumando
Da voz da fonte que aos soluços chora,
Da luz da lua a terra prateando.

Da igreja iluminada onde em criança
Rezamos com inocência e confiança
Preces a Deus com fé tão incontida!

Mas há sempre um lugar em nós guardado
Para abrigar no coração magoado
Um saudade a mais em nossa vida.


Bernardina Vilar

janeiro 12, 2021

janeiro 11, 2021

NUNCA HOUVE PALAVRAS



NUNCA HOUVE PALAVRAS

Nunca houve palavras para gritar a tua ausência
Apenas o coração
Pulsando a solidão antes de ti
Quando o teu rosto dóia no meu rosto
E eu descobri as minhas mãos sem as tuas
E os teus olhos não eram mais
que um lugar escondido onde a primavera
refaz o seu vestido de corolas.

E não havia um nome para a tua ausência.

Mas tu vieste.

Do coração da noite?
Dos braços da manhã?
Dos bosques do Outono?

Tu vieste.
E acordas todas as horas.
Preenches todos os minutos.
acendes todas as fogueiras
escreves todas as palavras.

Um canto de alegria desprende-se dos meus dedos
quando toco o teu corpo e habito em ti
e a noite não existe
porque as nossas bocas acendem na madrugada
uma aurora de beijos.

Oh, meu amor,
doem-me os braços de te abraçar,
trago as mãos acesas,
a boca desfeita
e a solidão acorda em mim um grito de silêncio quando
o medo de perder-te é um corcel que pisa os meus cabelos
e se perde depois numa estrada deserta
por onde caminhas nua.
Como se estivesses triste

Joaquim Pessoa




De súbito cessou a vida.


De súbito cessou a vida.

De súbito cessou a vida.
Foram simples palavras breves.
Tudo continuou como estava.

O mesmo teto, o mesmo vento,
o mesmo espaço, os mesmos gestos,
Porém como que eternizados.

Unção, calor, surpresa, risos
tudo eram chapas fotográficas
há muito tempo reveladas.

Todas as cousas tinham sido
e se mantinham sem reserva
numa sucessão automática.

Passos caminhavam no assoalho,
talheres batiam nos dentes,
janelas se abriam, fechavam.

Vinham noites e vinham luas,
madrugadas com sino e chuva.
Sapatos iam na enxurrada.

Meninas chegavam gritando.
Nasciam flores de esmeralda
no asfalto! mas sem esperança.

Jornais prometiam com zelo
em grandes tópicos vermelhos
o fim de uma guerra. Guerra?...

Os que não sabiam falavam.
Quem não sentia tinha o pranto.
(O pranto era ainda o recurso
de velhas cousas coniventes.)

Nem o menor sinal de vida.
Tão-só no fundo espelho a face
lívida, a face lívida.

Henriqueta Lisboa
Publicado: A Face Lívida (1945)

JANELA


JANELA

Quem é você que se esconde por traz da janela!
Pela vidraça, vejo o seu rosto quieto.
Em silêncio eu arrisco ler seus pensamentos
Fixados na janela do seu quarto
Só um leve sorriso alcançou os meus olhos..
Seu olhar nada expressa, menos mal!
O tom não definido, mas pintei...
Com a cor da minha imaginação

Glória Dantas

SAUDADE


SAUDADE

Nesses versos sem rimas
extravaso a dor da tua saudade... 
E a certeza de não mais te ver
faz os meus dias sombrios e sem crença,
pois levastes contigo a alegria do meu viver.

Como te procurar... Para que te procurar, 
se já senti o gosto da solidão
mesmo estando em teus braços? 
Triste lembrar o teu olhar perdido...
E eu, iludida, não percebia
Que com outra tu vivias a sonhar.

Glória Dantas

MARCAS


MARCAS

O tempo esmaga, devora..
Mas não mata nossa sensibilidade.
E quando passa, acumulamos experiências
e deixam no rosto marcas
que nem sempre percebemos.
O coração criança
respira ainda os delírios da juventude
e dos anos vividos.
Já não choro o tempo que passou, 
pois faço dele meu presente...
Mas meus passos cansados, 
a mente dispersa..
No entanto, sigo a minha estrada,
contemplando a vida,
que a cada instante me chama para o momento.
Já não olho para trás, 
Pois há muito o passado se perdeu
Nas curvas, nas esquinas, 
Que já nem lembro mais...

Glória Dantas

NOS BRAÇOS DO TEMPO


NOS BRAÇOS DO TEMPO

Sinto cada gota de lágrima 
que banha meu rosto, 
mas que suaviza a fadiga da face sofrida. 
Alma aflita, que procura liberdade para fugir... 
Já não importa em que direção... 
Só quero sumir entre vendavais, 
tempestades, qualquer lugar 
onde eu possa adormecer, 
nos braços do tempo, em pleno Céu aberto. 
Ânsia louca, desespero completo
que me tira a noção do adequado...
Abreviar seria prudente... 
Pois sinto o peso que castiga meus dias.

Glória Dantas

Saudade


Saudade

A saudade sempre vai existir em mim...
Às vezes me dá as costas, por alguns minutos,
e quando retorna, caprichosa e fagueira,
vem achando que tudo pode...
Pretensiosa e arrogante, não pede licença...
Nem pergunta se pode ficar!

Glória Dantas

A vida é...


A vida é enchente de surpresas
que exibe suas marcas, sem compaixão
deixando ausente 
os raros momentos de outrora....
devolvendo lembranças amargas.

Um verdadeiro vendaval de aflição...
condenando a viver na legítima solidão.
Face cansada, olhos brilhantes
que refletem pura saudade!
O sorriso, adereço raro, abrigado
no mais profundo silêncio da alma

Glória Dantas

Liberdade


LIBERDADE...

Você me deixou livre,
mas eu não queria essa liberdade imatura.
Queria sua mão, segurando a minha...
Apertando delicadamente.
Ao caminhar na estrada..
Medir qual o maior passo e
comparar se as pegadas no solo
faziam diferenças das minhas. 
Não quis! Sem Magoas!
Assunto concluído, sem emoções.
Sem as quatro estações!

Glória Dantas .

Colhendo


COLHENDO

Quando não temos um motivo para sorrir
O melhor é colher flores.
Somente elas entendem..
O porque do silêncio
Abrace sua dor com sabedoria,
colhendo flores no campo..


Glória Dantas