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agosto 30, 2012

SAUDADE



Saudade - O que será... não sei... procurei sabê-lo
em dicionários antigos e poeirentos
e noutros livros onde não achei o sentido
desta doce palavra de perfis ambíguos.

Dizem que azuis são as montanhas como ela,
que nela se obscurecem os amores longínquos,
e um bom e nobre amigo meu (e das estrelas)
a nomeia num tremor de cabelos e mãos.

Hoje em Eça de Queiroz sem cuidar a descubro,
seu segredo se evade, sua doçura me obceca
como uma mariposa de estranho e fino corpo
sempre longe - tão longe! - de minhas redes tranquilas.

Saudade... Oiça, vizinho, sabe o significado
desta palavra branca que se evade como um peixe?
Não... e me treme na boca seu tremor delicado...
Saudade...

Pablo Neruda
In Crepusculário

AMOR E ÓDIO



Amor, te odeio
pelo que me fazes sofrer,
te odeio
porque não paro
de te querer,
te odeio porque sofro,
e, vivo, morro,
te odeio porque
em ti naufrago
quando era de ti
que tinha de vir
o meu socorro.

Affonso Romano de Sant'Anna



Agradeço sua visita. 
Volte sempre e comente!

TERROR DE TE AMAR




Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo
Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa.

Sophia de Mello Breyner Andresen
In Poemas de Amor



agosto 29, 2012

DE QUE SÃO FEITOS OS DIAS?




De que são feitos os dias?
De pequenos desejos,
vagarosas saudades,
silenciosas lembranças.

Entre mágoas sombrias,
momentâneos lampejos:
vagas felicidades,
inatuais esperanças.

De loucuras, de crime,
de pecados, de glórias,
do medo que encadeia todas essas mudanças.

Dentro deles vivemos,
dentro deles choramos,
em duros desenlaces e em sinistras alianças.


Cecília Meireles,
in Canções.

agosto 27, 2012

CHAMA



acender uma chama com cuidado
todas as noites
para que vele os sonhos
para que a alma não se apague
para que a poesia não escape
sombra sorrateira rente ao muros
arrumar todas as noites
as miragens ao pé da cama
como um jogo antigo
onde nas pedras vinham escritas
portas secretas.

Roseana Murray
In ‘Poesia Essencial’  

A PAIXÃO



Levanto a custo os olhos da página;
ardem;
ardem cegos de tanta neve.
Faz dó esta paixão pelo silêncio,
pelo sussurro do silêncio,
pelo ardor
do silêncio que só os dedos adivinham.
Cegos, também.


Eugénio de Andrade 

AS MÃOS



Que tristeza tão inútil essas mãos
que nem sempre são flores
que se dêem:
abertas são apenas abandono,
fechadas são pálpebras imensas
carregadas de sono

Eugénio de Andrade 

agosto 23, 2012

É MELANCOLIA



Te chamarás silêncio doravante.
E o lugar que ocupas no ar
se chamará melancolia.

Escreverei no vinho rubro um nome:
o teu nome que esteve junto a minha'alma
sorrindo entre violetas.

Agora olho ao longe, absorto,
esta mão que andou por teu rosto,
que sonhou junto a ti.

Esta mão distante, de outro mundo,
que conheceu uma rosa e outra rosa,
e o tépido, o lento nácar.

Um dia irei buscar-me, irei buscar
meu fantasma sedento entre os pinheiros
e a palavra amor.

Te chamarás silêncio doravante.
Eu o escrevo com a mão que aquele dia
ia contigo entre os pinheiros.

Eduardo Carranza

VAZIO



Há certos dias
Que sinto em min’alma
Um vazio infinito,
Um vazio sem sentido,
Um vazio indefinível,
Vazio dos ventos e procelas,
Vazio que vem de longe
Cuja origem desconheço,
Maior,
Muito maior que a solidão...

Há certos momentos
Que sinto dentro de mim
Um vazio talvez originário das vagas,
Dos grandes mares
E que às vezes me inunda,
Quase me faz soçobrar...

Há certas horas
Que sinto dentro de mim
Um vazio que se agiganta,
Diante do qual me sinto pequenino
E comparo este vazio tão grande
Ao vazio da hora do adeus...

Mas existe, sim,
Um vazio,
Muito maior do que todos os vazios,
E que se alojam no âmago dos corações,
O vazio imenso da saudade!...

Olympiades Guimarães Corrêa

UM CANÇÃO





Por detrás dos meus olhos há águas
Tenho de as chorar todas.

Tenho sempre um desejo de me elevar voando,
E de partir com as aves migratórias.

Respirar cores com os ventos
Nos grandes ares.

Oh, como estou triste...
O rosto da lua bem o sabe.

Por isso, à minha volta há muita devoção aveludada
E madrugada a aproximar-se.

Quando as minhas asas se quebraram
Contra o teu coração de pedra,

Caíram os melros, como rosas de luto,
Dos altos arbustos azuis.

Todo o chilreio reprimido
Quer jubilar de novo

E eu tenho um desejo de me elevar voando,
E de partir com as aves migratórias.

Else Lasker-Schüler


agosto 22, 2012

CLARICE LISPECTOR



"Sinto saudades de quem não me
 despedi direito, das coisas que
 deixei passar, de quem não tive
 mas quis muito ter."

Clarice Lispector

CLARICE LISPECTOR



"Saudade é um pouco como fome.
Só passa quando se come a presença.
Mas às vezes a saudade é tão profunda
que a presença é pouco:
quer-se absorver a outra pessoa toda.
Essa vontade de um ser o outro para 
uma unificação inteira é um dos

...sentimentos mais urgentes que
 se tem na vida"

Clarice Lispector

FABRÍCIO CARPINEJAR



"Ame por empréstimo. Ame devendo. Ame falindo.
Mas não crie arrependimentos por aquilo que não foi feito.
Sejamos mais reais em nossas dores.
Dê chance para a imperfeição. Insista.
Insisto."

Fabrício Carpinejar

GRACILIANO RAMOS



‎"Comovo-me em excesso, por natureza e por ofício.
Acho medonho alguém viver sem paixões."

Graciliano Ramos

agosto 21, 2012

SAUDADES QUE SÃO?



Saudades o que são? São cinzas frias
Que foram fogo e luz no coração;
Mas cinzas tristes, pálidas e frias
Sepultadas no fundo dum vulcão.

Que são saudades? Sombras fugidias
Que em vão tentamos alcançar, em vão;
Sombras errantes pelas noites frias
Nos caminhos sem luz do coração.

Saudade é fumo que uma brisa ondeia,
Vento triste que chora por alguém;
Ondas mortas rojando-se na areia,

Sombras que vindas de outro mundo, além,
Formam a névoa que hoje me rodeia,
Sombras perdidas, sombras sem ninguém ...


Anrique Paço D'Arcos

agosto 19, 2012

SABEDORIA

Nos braços do tempo...

Tudo o tempo leva.
A própria vida não dura.
Com sabedoria,
colhe a alegria de agora
para a SAUDADE futura.

Helena Kolody


agosto 18, 2012

CREPÚSCULO



Todas as cousas têm o aspecto vago e mudo
Como se as envolvesse uma bruma de incenso;
No alto, uma nuvem, só, num nastro largo e extenso,
Presinta do céu calmo a caris de veludo.

Tudo: o campo, a montanha, o alto rochedo agudo
Se esfuma numa suave água-tinta... e, suspenso,
Espalhando-se no ar, como um nevoeiro denso,
Um tom neutro de cinza empoeirando tudo.

Nest'hora, muita vez, sinto um mole cansaço,
Como que o ar me falta e a fôrça se me esgota...
Som de Ângelus, moroso, a rolar pelo espaço...

Neste letargo que, pouco a pouco, me invade,
Avulta e cresce dentro em mim essa remota
Sombra da minha Dor e da minha SAUDADE.


Francisca Júlia
In “Poesias”

agosto 16, 2012

POR DISTRAÇÃO



Ao fim de tantos anos em silêncio
descobrimos
que uma lágrima ainda sulca o rosto árido.
Com ela cultivamos esquálidos jardins
na varanda solitária
que cuidamos como parte de nós próprios.

Mais tarde, diremos "Bom-Dia"
aos pardais tranqüilos no meio das flores
e, do outro lado da rua,
talvez alguém, distraído, nos sorria.

Manuel Filipe

A ORQUÍDEA




A orquídea parece
uma flor viva, uma
boca, e nos assusta.
Flor aracnídea.

Vagamente humana,
boca, embora feita
de inocentes pétalas,
já supõe perfídia.

Já supõe palavra
embora muda
Já supõe insídia.

Que estará dizendo
o lábio quase humano
da orquídea?

Cassiano Ricardo
in Antologia Poética

JÁ....



Segure o beijo antes que acabe,
que o amor desabe,
que a aurora canse.
A vida tem nuances não entendidas.
Adere esse momento no teu peito e goza.
Aspira fundo o âmago da rosa
antes que ele se desloque,
desapareça,
desencante.
Antes que a flor desaconteça,
bebe o cerne quente desse instante.

Flora Figueiredo
In Florescência

agosto 13, 2012

O SONETO DA ESPERA




O coração tem que esperar, mais nada!
Inda que a espera exaure a vida inteira
até que emprenhe o banho de alvorada
a luz das águas remansosas da ribeira...

O amor tem que esperar essa chegada!
Inda que chegue ao nunca do amanhã,
até que soem os clarins da madrugada
no ouvido íntimo dos sinos da manhã...

Sonhos são deuses surdos, nada mais!
E para deuses não existem horizontes
em que o amor desponte eternamente...

Sonhos de amor são brisas sazonais...
Às vezes partem por alguns instantes
e às vezes vão embora para sempre...

A. Estebanez 

agosto 11, 2012

CONTA-ME OUTRA VEZ




Conta-me outra vez, é tão bonita
que não me canso nunca de a ouvir.
Repete-me de novo, os dois da história
foram felizes até à morte,
ela não foi infiel, ele nem
se lembrou de a enganar. E não te esqueças,
apesar do tempo e dos problemas,
continuavam a beijar-se cada noite.
Conta-me mil vezes, por favor:
é a história mais linda que conheço.

Amalia Bautista

Sinto saudades...


“Sinto saudades 
das coisas que vivi
e das que deixei passar,
sem curtir na totalidade.

Quantas vezes 
tenho vontade de encontrar 
não sei o que...
não sei onde...
para resgatar alguma coisa 
que nem sei o que é 
e nem onde perdi...”

Clarice Lispector

agosto 08, 2012

Ó PESO DO CORAÇÃO! ...


Ó peso do coração!
Na grande noite da vida,
teus pesares que serão?

A sorte amadurecida
resplandece em minha mão:
lúcida, clara, polida.

Nem saudade nem paixão
nem morte nem despedida
seu brilho escurecerão.

Na grande noite da vida
brilha a sorte. O coração,
porém, é a dor desmedida.

Maior que a sorte e que a vida...


Cecília Meireles
In: Canções 

agosto 02, 2012

SAUDADES



Dominando a planície, a fronde aberta
Ao Sol, beijada pela ventania,
De áureas flores e pássaros coberta,
Farfalhando, aquela árvore se erguia.

Quando o Sol, pelo azul, a chama experta,
Como um jalde crisântemo - se abria,
Cantava logo um rumor d'asa, e, alerta,
Logo o bando de pássaros a enchia.

Era toda rumor. Suaves, bailando
Em torno, havia, namoradas dela,
Borboletas intrépidas, em bando.

E, do chão, como fúlgidas centelhas,
Insetos de ouro vinham ver aquela
Doce amiga de pássaros e abelhas.

Humberto de Campos
In ‘Poesias Completas’